segunda-feira, 17 de setembro de 2012

Inhotim: as sensações que ficam

Um passeio pelo paraíso de arte contemporânea

A viagem já começa incrível. Em direção ao museu, no município de Brumadinho, localizado na região metropolitana de Belo Horizonte, a estrada colore-se inteiramente de ipês amarelos. As flores parecem brilhar, contra o céu azul e a mata verde.

Depois dessa preparação, é hora de adentrar em um verdadeiro oásis. O Instituto Inhotim começou a ser idealizado pelo empresário Bernardo Paz em meados da década de 1980. Em 1984, o local foi visitado pelo renomado paisagista Roberto Burle Marx, que apresentou algumas sugestões e colaborações para os jardins.

Ao longo do tempo, essa propriedade particular foi se transformando, fazendo nascer um grande espaço cultural. Foi apenas em 2006 que o acervo cultural e ambiental foi aberto ao público, com estrutura completa. Enormes galpões foram construídos,  abrigando obras de arte contemporânea. Em Inhotim, tudo é espetáculo: as obras, o acervo botânico, o cuidado com cada detalhe.


Nossas escolhas
Um dia é pouco para visitar Inhotim. É preciso fazer escolhas e visitar apenas algumas instalações. De nada adianta correr e não aproveitar toda a fruição que cada obra pode proporcionar. A ausência de um percurso linear preestabelecido permite que o visitante crie sua própria experiência. São cerca de 70 obras em exposição, que se dividem entre trabalhos permanentes e temporários, expostos em quatro galerias. A proposta do museu compreende diferentes perspectivas de exibição. Muitas obras estão expostas ao ar livre, integrando-se à paisagem. Outras se encontram em espaços fechados, grandes pavilhões. A coexistência de espaços abertos e fechados promove uma experiência singular de fruição da obra de arte.

No Instituto é possível vivenciar exatamente os efeitos que a arte contemporânea busca atingir: o deslocamento de sentidos e, principalmente, de expectativas. O inesperado é fantástico. Cada experiência que Inhotim proporciona é única e provoca todos os sentidos: visão, audição, tato, olfato e paladar.  Desde o contato com a natureza até a participação das instalações artísticas. Às vezes você não enxerga e deve se concentrar nos sons e confiar no tato. Em outros momentos você observa uma cena projetada na parede e deve imaginar as conexões e consequências daquele fragmento. Cada detalhe é cuidadosamente pensado. Não escapa nem a luminária da lanchonete!

As obras materializam questões abstratas de forma incrível. Para começar, basta citar a instalação de Cido Meireles, chamada “Através”. Com a utilização de materiais cotidianos, o artista propõe uma análise mais profunda. Através da disposição de objetos comumente utilizados para criar barreiras – como cercas de madeira, arames farpados, cortinas, vidros – em torno de outro objeto central, o artista busca uma reflexão sobre a nossa maneira de perceber o mundo e os diversos empecilhos e limitações que nós mesmos criamos, impedindo a visão clara e simples. Bela metáfora =]

"Através", de Cido Meireles

Continuando a falar de Cido Meireles, outra obra sua em exposição é “Desvio para o vermelhoI: Impregnação, II: Entorno, III: Desvio”. Este é um de seus trabalhos mais complexos e ambiciosos – concebido em 1967, montado em diferentes versões desde 1984 e exibido em Inhotim em caráter permanente desde 2006. Trata-se de uma obra dividida em três diferentes “espaços”: no primeiro (Impregnação) nos deparamos com um cômodo ocupado por uma coleção monocromática de objetos vermelhos – bonita, mas exaustiva. Nos ambientes seguintes, uma série de simbolismos e metáforas. Um espaço completamente escuro, ocupado apenas por uma pia, da qual jorra um líquido vermelho. O que interessa ao artista nesta obra é oferecer uma sequência de impactos sensoriais e psicológicos ao espectador.
"Desvio para o vermelho", de Cido Meireles
                     
Outra instalação que dentre tantas merece destaque (numa seleção completamente subjetiva, gente!) foi o "Sonic Pavilion". Com acesso por uma trilha isolada, no alto de um morro, a instalação consiste em uma construção de vidro dentro da qual o espectador ouve a transmissão contínua de sons emitidos há centenas de metros no interior da Terra e captados por microfones geológicos. A arquitetura se funde a uma obra de arte invisível que está sempre em transformação. A vontade é de ficar ali por um longo tempo, deitada, sentindo a vibração do som e percebendo uma paz inexplicável.

"Sonic Pavilion"

Dentre as exposições temporárias, cabe destacar a “Forty Part Motet”, de Janet Cardiff. Em um grande galpão, totalmente recoberto por material que proporciona um isolamento acústico, diversas caixas de som são espalhadas. O visitante, então, é convidado a sentar-se.  De cada caixa de som ouve-se uma voz diferente. O que se escuta é o moteto (um tipo de composição polifônica medieval) para oito coros e cinco vozes, composto por Thomas Tallis, compositor inglês do século XVI. A composição trata de humildade e transcendência, dois temas importantes em uma época em que a fé católica era reprimida pelo Estado soberano da Inglaterra. O incrível é que a artista usa um alto-falante para cada voz, permitindo ao espectador ouvir as diferentes vozes e perceber as diferentes combinações e harmonias à medida que percorre a instalação. Olhos fechados te transportam, sem dúvida, para outro mundo.

"Forty Part Motet"


Tantas outras obras espalhadas por esse “oásis artístico” são incríveis e merecem ser visitadas várias vezes. A cada contato, novas associações, sentimentos e possibilidades. Contar aqui pra vocês é bom para despertar a curiosidade, mas essas palavras e imagens não dão conta de transmitir o impacto de vivenciar cada uma dessas obras. Inhotim é pra ficar sempre com vontade uma próxima vez!

"Narcissus Garden", de Yayoi Kusama

"Passarinhos", de Adriana Varejão
"Troca-Troca", de Jarbas Lopes


Sempre fica uma parte da gente em Inhotim hehe! "De Lama Lâmina", de Matthew Barney


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